Ou isto ou aquilo
Ou se tem chuva e não se tem sol
ou se tem sol e não se tem chuva!
Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!
Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.
É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo em dois lugares!
Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e gasto o dinheiro.
Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo …
e vivo escolhendo o dia inteiro!
Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranqüilo.
Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo.
Colar de Carolina
Com seu colar de coral,
Carolina
corre por entre as colunas
da colina.
O colar de Carolina
colore o colo de cal,
torna corada a menina.
E o sol, vendo aquela cor
do colar de Carolina,
põe coroas de coral
nas colunas da colina.
A avó do menino
A avó
vive só.
Na casa da avó
o galo liró
faz “cocorocó!”
A avó bate pão-de-ló
e anda um vento-t-o-tó
na cortina de filó.
A avó
vive só.
Mas se o neto meninó
mas se o neto Ricardó
mas se o neto travessó
vai à casa da avó,
os dois jogam dominó.
A Pombinha da Mata
Três meninos na mata ouviram
uma pombinha gemer.
“Eu acho que ela está com fome”,
disse o primeiro,
“e não tem nada para comer.”
Três meninos na mata ouviram
uma pombinha carpir.
“Eu acho que ela ficou presa”,
disse o segundo,
“e não sabe como fugir.”
Três meninos na mata ouviram
uma pombinha gemer.
“Eu acho que ela está com saudade”,
disse o terceiro,
“e com certeza vai morrer.”
O mosquito escreve
O mosquito pernilongo
trança as pernas, faz um M,
depois, treme, treme, treme,
faz um O bastante oblongo,
faz um S.
O mosquito sobe e desce.
Com artes que ninguém vê,
faz um Q,
faz um U, e faz um I.
Este mosquito
esquisito
cruza as patas, faz um T.
E aí,
se arredonda e faz outro O,
mais bonito.
Oh!
Já não é analfabeto,
esse inseto,
pois sabe escrever seu nome.
Mas depois vai procurar
alguém que possa picar,
pois escrever cansa,
não é, criança?
E ele está com muita fome.
A bailarina
Esta menina
tão pequenina
quer ser bailarina.
Não conhece nem dó nem ré
mas sabe ficar na ponta do pé.
Não conhece nem mi nem fá
Mas inclina o corpo para cá e para lá.
Não conhece nem lá nem si,
mas fecha os olhos e sorri.
Roda, roda, roda, com os bracinhos no ar
e não fica tonta nem sai do lugar.
Põe no cabelo uma estrela e um véu
e diz que caiu do céu.
Esta menina
tão pequenina
quer ser bailarina.
Mas depois esquece todas as danças,
e também quer dormir como as outras crianças.
Para ir à Lua
Enquanto não têm foguetes
para ir à Lua
os meninos deslizam de patinete
pelas calçadas da rua.
Vão cegos de velocidade:
mesmo que quebrem o nariz,
que grande felicidade!
Ser veloz é ser feliz.
Ah! se pudessem ser anjos
de longas asas!
Mas são apenas marmanjos.
A língua do Nhem
Havia uma velhinha
que andava aborrecida
pois dava a sua vida
para falar com alguém.
E estava sempre em casa
a boa velhinha
resmungando sozinha:
nhem-nhem-nhem-nhem-nhem-nhem…
O gato que dormia
no canto da cozinha
escutando a velhinha,
principiou também
a miar nessa língua
e se ela resmungava,
o gatinho a acompanhava:
nhem-nhem-nhem-nhem-nhem-nhem…
Depois veio o cachorro
da casa da vizinha,
pato, cabra e galinha
de cá, de lá, de além,
e todos aprenderam
a falar noite e dia
naquela melodia
nhem-nhem-nhem-nhem-nhem-nhem…
De modo que a velhinha
que muito padecia
por não ter companhia
nem falar com ninguém,
ficou toda contente,
pois mal a boca abria
tudo lhe respondia:
nhem-nhem-nhem-nhem-nhem-nhem…
Pescaria
Cesto de peixes no chão.
Cheio de peixes, o mar.
Cheiro de peixe pelo ar.
E peixes no chão.
Chora a espuma pela areia,
na maré cheia.
As mãos do mar vêm e vão,
as mãos do mar pela areia
onde os peixes estão.
As mãos do mar vêm e vão,
em vão.
Não chegarão
aos peixes do chão.
Por isso chora, na areia,
a espuma da maré cheia.
Jogo de Bola
A bela bola
rola:
a bela bola do Raul.
Bola amarela,
a da Arabela.
A do Raul,
azul.
Rola a amarela
e pula a azul.
A bola é mole,
é mole e rola.
A bola é bela,
é bela e pula.
É bella, rola e pula,
é mole, amarela, azul.
A de Raul é de Arabela,
e a de Arabela é de Raul.
O passarinho do sapé
P tem papo
o P tem pé.
É o P que pia?
(Piu!)
Quem é?
O P não pia:
O P não é.
O P só tem papo
e pé.
Será o sapo?
O sapo não é.
(Piu!)
que fez seu ninho
no sapé.
Pio com papo.
Pio com pé.
Piu-piu-piu:
Passarinho.
Passarinho
no sapé.
Sonhos da menina
A flor com que a menina sonha
está no sonho?
ou na fronha?
Sonho
risonho:
O vento sozinho
no seu carrinho.
De que tamanho
seria o rebanho?
A vizinha
apanha
a sombrinha
de teia de aranha . . .
Na lua há um ninho
de passarinho.
A lua com que a menina sonha
é o linho do sonho
ou a lua da fronha?
O lagarto medroso
O lagarto parece uma folha
verde e amarela.
E reside entre as folhas, o tanque
e a escada de pedra.
De repente sai da folhagem,
depressa, depressa
olha o sol, mira as nuvens e corre
por cima da pedra.
Bebe o sol, bebe o dia parado,
sua forma tão quieta,
não se sabe se é bicho, se é folha
caída na pedra.
Quando alguém se aproxima,
— oh! Que sombra é aquela? —
o lagarto logo se esconde
entre folhas e pedra.
Mas, no abrigo, levanta a cabeça
assustada e esperta:
que gigantes são esses que passam
pela escada de pedra?
Assim vive, cheio de medo,
intimidado e alerta,
o lagarto (de que todos gostam)
entre as folhas, o tanque e a pedra.
Cuidadoso e curioso,
o lagarto observa.
E não vê que os gigantes sorriem
para ele, da pedra.
Assim vive, cheio de medo,
intimidado e alerta,
o lagarto (de que todos gostam)
entre as folhas, o tanque e a pedra.
A chácara do Chico Bolacha
Na chácara do Chico Bolacha
o que se procura
nunca se acha!
Quando chove muito,
O Chico brinca de barco,
porque a chácara vira charco.
Quando não chove nada,
Chico trabalha com a enxada
e logo se machuca
e fica de mão inchada.
Por isso, com Chico Bolacha,
o que se procura
nunca se acha.
Dizem que a chácara do Chico
só tem mesmo chuchu
e um cachorrinho coxo
que se chama Caxambu.
Outras coisas, ninguém procura,
porque não acha.
Coitado do Chico Bolacha!
Canção da flor da pimenta
A flor da pimenta é uma pequena estrela,
fina e branca,
a flor da pimenta.
Frutinhas de fogo vêm depois da festa
das estrelas.
Frutinhas de fogo.
Uns coraçõezinhos roxas, áureos, rubras,
muito ardentes.
Uns coraçõezinhos.
E as pequenas flores tão sem firmamento
jazem longe.
As pequenas flores…
Mudaram-se em farpas, sementes de fogo
tão pungentes!
Mudaram-se em farpas.
Novas se abrirão,
leves,
brancas,
puras,
deste fogo,
muitas estrelinhas…
O santo no monte
No monte,
o Santo
em seu manto,
sorria tanto!
Sorria para uma fonte
que havia no alto do monte
e também porque defronte
se via o sol no horizonte.
No monte
o Santo
em seu manto
chora tanto!
Chora – pois não há mais fonte,
e agora há um moro defronte
que já não deixa do monte
ver o sol nem o horizonte.
No monte
o Santo
em seu manto
chora tanto!
(Duro
muro
escuro!)
O menino azul
O menino quer um burrinho
para passear.
Um burrinho manso,
que não corra nem pule,
mas que saiba conversar.
O menino quer um burrinho
que saiba dizer
o nome dos rios,
das montanhas, das flores,
— de tudo o que aparecer.
O menino quer um burrinho
que saiba inventar histórias bonitas
com pessoas e bichos
e com barquinhos no mar.
E os dois sairão pelo mundo
que é como um jardim
apenas mais largo
e talvez mais comprido
e que não tenha fim.
(Quem souber de um burrinho desses,
pode escrever
para a Ruas das Casas,
Número das Portas,
ao Menino Azul que não sabe ler.)
As Meninas
Arabela
abria a janela.
Carolina
erguia a cortina.
E Maria
olhava e sorria:
“Bom dia!”
Arabela
foi sempre a mais bela.
Carolina,
a mais sábia menina.
E Maria
apenas sorria:
“Bom dia!”
Pensaremos em cada menina
que vivia naquela janela;
uma que se chamava Arabela,
uma que se chamou Carolina.
Mas a profunda saudade
é Maria, Maria, Maria,
que dizia com voz de amizade:
“Bom dia!”
O Eco
O menino pergunta ao eco
Onde é que ele se esconde.
Mas o eco só responde: Onde? Onde?
O menino também lhe pede:
Eco, vem passear comigo!
Mas não sabe se o eco é amigo
ou inimigo.
Pois só lhe ouve dizer: Migo!
O vestido de Laura
O vestido de Laura
é de três babados,
todos bordados.
O primeiro, todinho,
todinho de flores
de muitas cores.
No segundo, apenas
borboletas voando,
num fino bando.
O terceiro, estrelas,
estrelas de renda
– talvez de lenda…
O vestido de Laura
vamos ver agora,
sem mais demora!
Que as estrelas passam,
borbaletas, flores
perdem suas cores.
Se não formos depressa,
acabou-se o vestido
todo bordado e florido!
Bolhas
Olha a bolha d’água
no galho!
Olha o orvalho!
Olha a bolha de vinho
na rolha!
Olha a bolha!
Olha a bolha na mão
Que trabalha!
Olha a bolha de sabão
na ponta da palha:
brilha, espelha
e se espalha.
Olha a bolha!
Olha a bolha
que molha
a mão do menino:
A bolha da chuva da calha!
Pregão do vendedor de lima
Lima rima
pela rama
lima rima
pelo aroma.
O rumo é que leva o remo.
O remo é que leva a rima.
O ramo é que leva o aroma
porém o aroma é da lima.
É da lima o aroma
a aromar?
É da lima-lima
lima da limeira
do auro da lima
o aroma de ouro
do ar!
Lua depois da chuva
Olha a chuva:
molha a luva.
Cada gota de água
Como um bago de uva.
A chuva lava a rua.
A viúva leva
o guarda-chuva
e a luva.
Olha a chuva:
molha a luva
e o guarda-chuva
da viúva.
Vai a chuva
e chega a lua:
lua de chuva.
A folha na festa
Esta flor
não é da floresta.
Esta flor é da festa,
esta é a flor da giesta.
É a festa da flor
e a flor está na festa.
(E esta folha?
Que folha é esta?)
Esta folha não é da floresta.
Esta folha não é da giesta.
Não é folha da flor.
Mas está na festa.
Na festa da flor
na flor da giesta.
Uma flor quebrada
A raiz era escrava,
descabelada negrinha
que dia e noite ia e vinha
e para a flor trabalhava.
E a árvore foi tão bela!
Como um palácio. E o vento
pediu um casamento
a grande flor amarela.
Mas a festa foi breve,
pois era um vento tão forte
que em vez de amor trouxe morte
à airosa flor tão leve.
E a raiz suspirava
com muito sentimento.
Seu trabalho onde estava?
Todo perdido com o vento.
O violão e o vilão
Havia a viola da vila.
A viola e o violão.
Do vilão era a viola.
E da Olívia o violão.
O violão da Olívia dava
vida à vila, à vila dela.
O violão duvidava
da vida, da viola e dela.
Não vive Olívia na vila.
Na vila nem na viola.
O vilão levou-lhe a vida,
levando o violão dela.
No vale, a vila de Olívia
vela a vida
no seu violão vivida
e por um vilão levada.
Vida de Olívia — levada
por um vilão violento.
Violeta violada
pela viola do vento.
O tempo do temporal
O tempo
do temporal.
O tempo ao tempo
ao ar
e ao pó
do temporal.
E o doente ao pé do templo.
E o temporal no poente.
E o pó no doente.
O tempo do doente.
O ar, o pó do poente.
O temporal do tempo.
O último andar
No último andar é mais bonito:
do último andar se vê o mar.
É lá que eu quero morar.
O último andar é muito longe:
custa-se muito a chegar.
Mas é lá que eu quero morar.
Todo o céu fica a noite inteira
sobre o último andar.
É lá que eu quero morar.
Quando faz lua, no terraço
fica todo o luar.
É lá que eu quero morar.
Os passarinhos lá se escondem,
para ninguém os maltratar:
no último andar.
De lá se avista o mundo inteiro:
tudo parece perto, no ar.
É lá que eu quero morar:
no último andar.
Tanta tinta
Ah! Menina tonta,
toda suja de tinta
mal o sol desponta!
(Sentou-se na ponte,
muito desatenta…
E agora se espanta:
Quem é que a ponte pinta
com tanta tinta?…)
A ponte aponta
e se desaponta.
A tontinha tenta
limpar a tinta,
ponto por ponto
e pinta por pinta…
Ah! A menina tonta!
Não viu a tinta da ponte!
Leilão de Jardim
Quem me compra um jardim com flores?
borboletas de muitas cores,
lavadeiras e passarinhos,
ovos verdes e azuis nos ninhos?
Quem me compra este caracol?
Quem me compra um raio de sol?
Um lagarto entre o muro e a hera,
uma estátua da Primavera?
Quem me compra este formigueiro?
E este sapo, que é jardineiro?
E a cigarra e a sua canção?
E o grilinho dentro do chão?
(Este é meu leilão)